A abundância de coelho-bravo é monitorizada
periodicamente pelos Serviços Florestais em toda a Região Autónoma dos Açores,
através da contagem de coelhos ao longo de percursos pré-estabelecidos. As contagens são realizadas de noite, com
recurso a projetores de luz, e o número de coelhos observados é utilizado para
estimar um índice de abundância relativa.
As variações neste índice traduzem as flutuações no efetivo, e permitem
avaliar tendências populacionais e ajustar o esforço de caça de forma a
assegurar a sustentabilidade deste recurso, bem como o seu equilíbrio com as
atividades agrícolas e florestais. Este
método é o mesmo utilizado na monitorização da abundância de outras populações
de coelho, da Península Ibérica à Austrália (Beltran
1991;Ballinger & Morgan, 2002),
sendo considerado um método de referência (Barrio et al. 2010;Fernandez-de-Simon et
al. 2011).
Nos Açores, a monitorização é efetuada em São
Miguel e nas Flores, desde 2005 e 2006, respetivamente (Ferreira et al.
2012), tendo sido alargada às restantes ilhas em 2011. A rede de 62 percursos estabelecidos a nível
regional estende-se por 249,7 km.
Em cada ilha, nos
primeiros anos, estes percursos foram efetuados todos os meses, para perceber
as variações sazonais da abundância. Posteriormente foram definidos dois
períodos de contagens que permitem avaliar a abundância antes e após o período
reprodutivo, em janeiro-fevereiro e agosto-setembro, respetivamente.
(Clique em cada ilha para mais informação)
Após os surtos de doença hemorrágica viral, no
final de 2014 e início de 2015, que provocaram grandes mortalidades no
coelho-bravo em todas as ilhas, foi retomada a periodicidade mensal, de forma a
manter estas populações sob maior vigilância.
A análise molecular de material biológico recolhido de coelhos mortos
durante estes surtos, permitiu demonstrar que o agente causador foi o vírus da
nova variante da doença hemorrágica viral (RHDV2), e não o que até então
circulava nas populações açorianas de coelho-bravo, tendo sido possível
determinar uma provável região de origem no continente, bem como traçar a sua
dispersão pelo arquipélago (Almeida et al. 2015).
Em 2020, seis anos após estes surtos, em
algumas das ilhas a tendência das populações é ainda decrescente. Na ilha das Flores, onde a abundância permaneceu baixa até 2019, observam-se
agora os primeiros sinais de recuperação. Contudo, a abundância atual está
ainda muito longe da registada antes de 2015. É importante lembrar que a
população de coelho-bravo desta ilha era a única nos Açores que, até ao surto
de 2014/2015, nunca havia tido contacto com o vírus da doença hemorrágica. Na
ilha do Faial, a abundância de
coelho-bravo variou ao longo dos anos, mas a tendência foi de estabilidade ao
longo da última década. Já nas ilhas do Pico, Graciosa, São Jorge e Terceira, a abundância tem vindo a diminuir a cada ano, sobretudo a
partir de 2015. Em São Miguel, apesar do importante impacto da doença hemorrágica
viral, a abundância de coelho-bravo tem vindo a aumentar desde 2017 em parte da
ilha, enquanto que noutras partes continua baixa ou mesmo a diminuir. Na ilha de Santa Maria, a abundância de coelho-bravo tem permanecido nos
níveis mais baixos já registados nesta ilha. À data dos surtos de 2014/2015, a população de
coelho-bravo da ilha de Santa Maria estava ainda a recuperar de um importante
surto de doença hemorrágica viral que ocorrera no final de 2011.
Desde a entrada da RHDV2 nos Açores, têm-se
verificado novos surtos em várias ilhas, cujo impacto se reflete nos resultados
das contagens, como por exemplo em São Miguel em 2017, contudo em Santa Maria o
efeito parece ter sido mais dramático.
Desde 2005 mais de 70
colaboradores da DRRF percorreram 48081 km exclusivamente dedicados à contagem
de coelho-bravo. Este esforço, superior
a uma volta ao mundo, tem permitido sentir o pulso das populações desta espécie
ao longo dos anos em todo o arquipélago, e adequar a sua exploração às
realidades observadas em cada ilha.
Referências:
Almeida
T. Lopes AM, Magalhães MJ, Neves F, Pinheiro A, Gonçalves D, Leitão M, Esteves
PJ & Abrantes J. 2015. Tracking the evolution of the G1/RHDVb recombinante
strains introduced from the Iberian Peninsula to the Azores islands, Portugal. Infection, Genetics and Evolution 34: 307-313. [https://doi.org/10.1016/j.meegid.2015.07.010]
Ballinger A & Morgan DG. 2002. Validating two methods for monitoring population size of
European rabbit (Oryctolagus cuniculus).
Wildlife Research 29: 431-437. [https://doi.org/10.1071/WR01055]
Barrio IC, Acevedo P, Tortosa FS. 2010. Assessment of methods for estimating wildlife rabbit
population abundance in agricultural landscapes. European Journal of Widllife Research 56: 335-340. [https://doi.org/10.1007/s10344-009-0327-7]
Beltran JF. 1991.
Temporal abundance pattern of the wild rabbit in Doñana, SW Spain. Mammalia 55: 591-599. [https://doi.org/10.1515/mamm.1991.55.4.591]
Fernandez-de-Simon
J, Díaz-Ruiz F, Cirilli F, Tortosa FS, Villafuerte R, Delibes-Mateos M &
Ferreras P. 2011. Towards a standardized index of European rabbit
abundance in Iberian Mediterranean habitats. European Journal of Widllife Research 57: 1091-1100. [https://doi.org/10.1007/s10344-011-0524-z]
Ferreira
C, Rodrigues T, Leitão M, Paupério J, Gonçalves D & Alves PC. 2012. Gestão de recursos cinegéticos no arquipélago dos Açores – O Coelho-bravo.
CIBIO-UP e Direção Regional dos Recursos Florestais. Porto. [http://drrf-sraa.azores.gov.pt/areas/cinegetica/Documents/Livro_O_Coelho_bravo_2012.pdf]
Última atualização: 16 de novembro de 2020